sábado, 7 de agosto de 2010

Transcedência e Imanência


Transcendência e Imanência
(dedico este tempero de palavras ao meu amigo Marlon Ricardo)

É assim o tempo,



Céu cinza, olhares absortos


buzinas


braços e pernas concretos


verticalmente debruçam sobre a cidade.






O vento levemente me encosta.


Os cabelos grisalhos tentam acompanhar o movimento


geométrico de teus braços.






Num frenesi, fico por segundos inerte.


Vida e morte se fundem e confundem.


Segundos, ah, tempo...


por que me consomes, me agrides?


Condutor das mesmices.






Meus olhos veem um oceano


um cais.


Todos partindo


Todos fincando


e eu comendo formigas.


Deliciosamente saborosas.


A vida é um nada.


Alguém, levemente me toca.


Coitado!


mais um no tempo.


Apressa-te!


Apressadamente a morte o come.






O tempo é traidor e rio dele.


Desgraçadamente, rio.


Olho infinitamente as ruas.


Não sei se fico na minha insignificância de ser


ou começo a caminhar entre muitos.






Ouço ecos saindo de dentro de cada um que passa por mim.


Dizendo: Socorro!...

 
Desesperado, estou!


Maldito sou!


Por que existo?


Quem eu sou?

Ouço um bailado e babelicamente vozes em todas as direçõesCarne podre é essa que carrego sobre mim?


Confuso!


Roubei!


Matei!


Quero morrer!


Comunguei!


Pedi a Deus!


Estuprei!


Aceitei!


(...)






Vozes, vozes, vozes...


Estou sem direção.


Por quê? Por quê?


Humanamente sou!


Companheiro da morte!


Ela me espreita a todo momento.


O tempo colabora com minha destruição.






Passos acelerados...


Fugindo de mim.


Estou impregnado de mim.


Fico imóvel novamente.


Colericamente, me rasgo.


Estou sem pele.


Sinto formigas subindo sobre o meu corpo.


E elas, antropofagicamente,


num bailado


alimentando em êxtase.


Alimentem minha alma,


seres alados e eternos!






Minha carne exposta.


Minha vida exposta.


Ninguém me vê.


Todos passam por mim


como se eu não existisse.


Quero gritar, mas não consigo.


Ouço-me cavernosamente.






Dói!


A vida dói!


Ardem-me as chamas do sol.


Quero atravessar a rua.


Ultrapassá-la.


Chegar até mim.


Alguns passos, somente.






Dantescamente destruo os invasores que comem minha carne.


Estúpido tempo!


És a felicidade dos malditos!






Sinto o vento, abruptamente levar o pó, as formigas, meu corpo, minha alma.


Singularmente a vida .


Atravesso a rua...


Vou conseguir chegar ao outro lado?


Corre! Corre!


Alguém do outro lado grita.


Você consegue, corre, corre, corre!





O tempo não parou.






Dó pó retornarás!

Um comentário:

  1. Está aí uma diferença entre nós dois: tu ris do tempo, eu temo-o. Mas os versos são bons, me lembra o Arthur Rimbaud, Uma Temporada no Inferno.

    Outra coisa, no fim: "Do pó retornarás". O versículo bíblico diz "Ao pó retornarás". Creio que não foi sem intenção a troca de palavras. Poderias explicar?

    Au revoir.

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