domingo, 1 de agosto de 2010

Nonsense da Morte

           Nonsense da morte

Dialeticamente a vida vai...



Dialeticamente a morte chega.


Quando morrer


não quero nenhum anjo anunciar


com suas trombetas o meu fim.






Chorarei minha morte


com- pul- si- va- men- te


exatos quinze minutos.


Despedirei de mim


com remorsos, dores, saudades, lembranças e


arrependimentos.






Como não queria ter arrependimentos.






Estou sendo velado.


Violado.


Meu corpo ereto, minha alma ereta.


Intactos como um mármare na embriaguês da madrugada fúnebre.


Fico à espreita.


Observo todos.


Amigos, parentes, incrédulos,


pais e curiosos.






Um silêncio aconteceu.


Lá fora, há árvores,


corpos em putrefação, almas inquietas, almas ensimesmadas e


almas serenas.






O céu já não é o mesmo.


O dia virá e com ele a infinita distância do amanhecer.


Vermes pantagruelicamente


devorando a não vida.


Volto à sala fúnebre.


Velas, flores...


O cheiro da morte.


Choros incontidos.


Olhares absortos,


Olhares oblíquos,


Olhares de alívio,


Olhares para o vazio


na escuridão


no claustro da alma,


direcionado ao meu insignificante corpo indefeso.






Chegou alguém


de- ses- pe- ra- do.


Como se tivesse sabendo


da minha morte naquele instante.


Urros, lágrimas


des- con- tro- la- dos.


Agarrou-me como se eu sentisse.


Como querendo dizer:


Levante, Lázaro!


Quanta pretensão deste patético humano.


Quem é?


Não consigo identificar.


Choro...


Incrivelmente, choro a minha morte.


Uma alma chora.






Minha mãe. Ao meu lado, carne da mesma carne.


Suas mãos trêmulas


suavemente em meu rosto,


como se me ninasse.


Grito e ninguém me ouve.


Mãe, mãe, mãe ...


quero dizer tantas coisas...


Estou perdendo as forças, não consigo mais gritar e ela não me ouvir.


Volto à infância... Cuidado, meu filho, você vai se machucar...


Ah, como dói, dói, dói, dói, estou chorando, choro muito para o total vazio.


Suas lágrimas caem


pelo meu corpo enlutado.






Um aglomerado de pessoas


velando meu corpo.


Sinto dores, não sei como, mas dói!


Por tudo e por todos.


Ouço um os cantares fúnebres.


Não queria ter morrido!






Onde está meu pai?


Ah, meu pai...


Não consigo chorar.






Rio e choro muito.


Aproveitei, vivi, desisti, arrependi, chorei, sorri, amei, desamei, conquistei


...................................................................................................................................


É a despedida.


Todos querendo-me tocar.


Toquem, sintam


que esta carne é real.


Sou irreal aos olhos do mundo.


Percebam meu fim.


Realidade e realizado.


Ad infinitu!


Ad aeternu!


Fechou o caixão.


Gritos e desesperos.


Um coro mórbido na sala.


A extrema unção.


Começou a marcha fúnebre.


Segue-se até o buraco vazio e lúgubre.


Len- ta- men- te, segue!


Os coveiros,


os corvos


à prontidão.


Direções, caminhos, veredas, curvas...


Conduzindo-me ao eterno.


Vejo vários túmulos, cruzes, ângulos, formas, rostos em molduras desfigurados.


O céu às dez horas!


Ergo a minha alma ao céu...


Nuvens mancheanas.


Nuvens dalianas.






Morte, sua face não é como todos dizem.


É sobria e suave.


Thanatus, salve-me!


Seus braços eternos.


Seu cavalo imponente.


Seu ar, seu hálito...


Seduzem-me!


Aos poucos, sua voz me embriagou.


Seu corpo, seu carisma.


Caí na sua sedução.


E aqui estou!






Desceu meu corpo.


Sin- to- ma- ti- ca- men- te


.................................................


Estou agora só!


A morte já me deixou.


Clamo por ela e nada.


Cobrem-me de terra,


terra, terra, terra, terra, terra.


Con- cre- ta- men- te fui.


Já não existo mais.


Sou agora...


O que sou?


E eles, os que ficaram?


Lembraças, somente!


Vagas lembranças.


Depois? O esquecimento.


Depois?


o espaço, a elipse da minha existência!


Um total vazio!


Somente.

2 comentários:

  1. Caro Maurício,

    Essa filosofia fúnebre me espanta! Gente do céu, já é o terceiro blogue que eu leio hoje onde o tema é morte...

    Mas ok, vejo que encaras tudo com calma (apesar de arrependimentos e gritos acompanharem o corpo). No fim, a morte é sóbria e suave. Precisamos dela, talvez, para um mais além, ou um mais aquém de quem fica...

    Au revoir.

    ResponderExcluir
  2. Olá, professor!

    Passei para comentar seu poema, dizer-lhe que achei muito belo! Gostei muito do realismo que ele passou, do sentimento...
    Espero ainda ter a oportunidade de vê-lo recitando o poema!
    A morte é um assunto que gosto muito, aliás, é a única certeza que temos na vida!
    Gostei muito da sua visão retratada.
    Espero que continue sendo meu professor por bastante tempo, para que eu consiga obter ao menos uma parte de seu talento para escrever! hahaha

    Carpe Noctem...

    ResponderExcluir